A maior parte da cocaína que entra no Brasil vem da
Bolívia, atualmente o terceiro maior produtor mundial da droga. Os governos dos
dois países avaliam que 60% do volume produzido em território boliviano — 110
toneladas, segundo a ONU — saia de lá pela vasta região fronteiriça (3,4 mil
km) com o Brasil.
Isso não significa que o mercado consumidor final da
cocaína boliviana seja o brasileiro. Especialistas avaliam que, embora o
consumo tenha aumentado (900 mil usuários brasileiros) e o país seja o maior
consumidor da droga na América do Sul, o Brasil ainda é considerado uma rota
para escoamento da produção, por sua extensão e localização geográfica.
– Naturalmente, o Brasil é um ponto importante para a
saída da produção boliviana. A fronteira terrestre na parte mato-grossense é
extensa e de fácil trafegabilidade –, diz Pedro Florêncio, oficial brasileiro
na Ameripol (Polícia das Américas) – entidade criada em 2007 que integra
polícias de 20 países das Américas Central, do Norte e do Sul, com sede em
Bogotá, na Colômbia.
Para aumentar o controle e combater o tráfico na região,
Bolívia, Brasil e Estados Unidos devem fechar, em breve, um acordo trilateral
que inclui financiamento de compra de equipamentos, capacitação policial e
vigilância aérea por meio de aviões não tripulados. O ministro da Justiça do
Brasil, José Eduardo Cardozo, esteve na Bolívia no último mês de março para
negociar o “pacto” antidrogas.
– Brasil e Bolívia estão intensificando os esforços, mas
os narcotraficantes adaptam-se com facilidade às novas tecnologias e mudam as
rotas. Por isso, é preciso investir bastante na cooperação –, defende
Florêncio.
Rotas
Apesar das atenções voltadas à Bolívia, o Brasil continua
sendo usado como rota alternativa para a saída da cocaína produzida pela
Colômbia (maior produtor mundial, segundo a ONU, com 410 toneladas em 2010) e
pelo Peru (segundo colocado no ranking, com 300 toneladas produzidas).
O adido da Polícia Federal na Colômbia, José Adones de
Oliveira, avalia que o Brasil já não escoa quantidades tão grandes de droga
colombiana como anteriormente, mas que, por sua posição geográfica, o país
continua sendo usado para transporte de menores quantias.
– Há mais policiamento e cooperação entre as polícias das
fronteiras. Assim, um novo mapeamento das rotas vem se configurando. Para os
cartéis mexicanos, os grandes distribuidores da droga produzida nos países
andinos, é muito mais vantajoso enviar grandes remessas de cocaína pelo Oceano
Pacífico, Caribe e Panamá do que pelo Brasil –, afirma Adones.
O Equador também se transformou em um importante
país-trânsito. O governo dos Estados Unidos estima que 220 toneladas de cocaína
passem por ano pelo território equatoriano.
– Além do Equador e da Venezuela, outro importante
país-trânsito, há rotas submarinas em todo o Pacífico. Por submarino, toneladas
de cocaína vêm sendo remetidas aos Estados Unidos, Europa e Ásia. Algumas
passam pela África antes de chegar aos seus destinos finais –, diz Adones.
Mesmo com novas rotas desenhadas, o delegado avalia que
uma porcentagem ainda é traficada via Brasil.
– Não podemos dizer que temos o controle de toda a área,
especialmente por causa dos rios”, pondera, destacando a “habilidade” dos
traficantes que montam empresas-laranja e embarcam quantidades menores de
cocaína junto a produtos destinados à exportação, como madeira, café e castanha
do Pará.
Corrupção
Apesar da ação dos governos, cooperação entre polícias e
estratégias planejadas, a América Latina continua sendo um polo produtor e
distribuidor. Para o sociólogo colombiano Ricardo Vargas, autor de vários
livros sobre o narcotráfico, as ações coordenadas entre os países não tocam em
um dos pontos centrais: o combate à corrupção.
– O Brasil continua sendo uma rota importante de
escoamento inclusive por avião. Isso porque não há mecanismos de controle
efetivo e nem garantias de que as polícias dos países envolvidos não sejam
corruptíveis –, diz o pesquisador.
O sociólogo acrescenta que as pesquisas e dados oficiais
também não explicam o fato de o mercado consumidor estar aumentando, tanto no
Brasil como na Europa.
– Se mais gente consome, é porque as drogas continuam
chegando –, adverte Vargas.