O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
afirmou nesta segunda-feira (7) que as nações africanas deveriam
apostar no desenvolvimento agrícola como forma de garantir soberania
alimentar e gerar riquezas por meio da exportação dos produtos.
Em sua primeira viagem internacional após
deixar a presidência do Brasil, Lula veio ao Senegal para participar do
Fórum Social Mundial em uma mesa de debates sobre "A África na
geopolítica mundial", na qual falou ao lado do presidente senegalês,
Abdoulaye Wade.
Ao longo de sua exposição, bastante
aplaudida por dezenas de ativistas brasileiros, Lula defendeu a criação
de um Estado Palestino, apoiou a revolta popular no Egito, criticou as
potências econômicas e o neoliberalismo e exaltou os resultados de seus
governos (2003-2010), sobretudo no que diz respeito ao combate à
miséria.
Após voltar ao Brasil, o ex-mandatário
brasileiro fará outra viagem internacional neste mês: a convite,
visitará o presidente venezuelano, Hugo Chávez, que enfrentará eleições
em 2012.
Em sua fala no Fórum, Lula afirmou que as
nações africanas precisam cortar os laços de dependência que ainda
mantêm com as ex-metrópoles. Para isso, a questão alimentar seria
essencial. "Não há soberania efetiva sem segurança alimentar", disse.
Para o ex-presidente, a experiência brasileira na área agrícola, ainda
que não seja possível a "transposição de modelos", revela que é viável
a expansão da produção de alimentos em terras pouco valorizadas.
"Até os anos 70 o cerrado brasileiro era
considerado um deserto verde, sem condições de sustentar uma
agricultura produtiva", lembrou Lula. Mas, graças à atuação do Estado
no fomento à pesquisa, essas regiões "tornaram-se grandes fornecedoras
de alimentos para o mundo e viabilizou-se a política de erradicação da
fome em nosso país".
Para ele, as savanas africanas poderiam
repetir a história do cerrado no continente. Segundo Lula, as savanas
se espalham por mais de 25 países da África e, com investimento em
pesquisa, seria possível desenvolver seu potencial agrícola.
Hoje, apenas 10% da área das savanas
possuem cultivos agrícolas. Na opinião do brasileiro, a elevação desse
índice ajudaria a reduzir o drama da fome no continente, que poderia se
tornar um grande fornecedor de alimentos no mundo. "Se o território dos
países ricos está escasso para produzir alimentos, se há mais
africanos, chineses, indianos, coreanos e latinos comendo, onde há
terra para produzir alimento?", questionou, para em seguida responder:
"A África e a América Latina podem e devem suprir os alimentos que são
um produto essencial para a vida humana".
Lula criticou ainda os subsídios agrícolas
dos países ricos e a atual escalada de preços das commodities no mundo,
afirmando que a culpa é da especulação. "Não há nenhuma explicação para
o preço do petróleo superar 100 dólares", disse.
Em ataque direto à ciranda financeira, o
ex-mandatário lembrou que, apesar de sempre faltarem recursos para
programas de erradicação da fome, sobraram fundos para "resgatar bancos
e instituições financeiras na recente crise financeira internacional".
Para o brasileiro, os países africanos
precisam alterar os modelos de cooperação internacional vigentes e não
mais aceitar a imposição de modelos externos.
Revoltas populares
O ex-presidente brasileiro registrou pleno
apoio às revoltas populares que ocorrem no Norte da África e no Oriente
Médio – segundo ele, causadas pela pobreza, pela dominação de tiranos e
pela submissão das políticas internas à agenda das grandes potências. E
avaliou que a criação de uma cultura de paz – um dos temas históricos
do Fórum Social Mundial – não dependeria apenas do fim do comércio de
armas, mas sobretudo do combate à fome, à desigualdade e ao desemprego.
Além de criticar a intolerância étnica,
cultural e religiosa, Lula mais uma vez atacou o modus operandi dos
países ricos, em especial a política da guerra preventiva dos Estados
Unidos. Disse que, sem ingerências externas, a África teria mais
chances de acelerar seu desenvolvimento econômico e social. "Nos 29
países que visitei como presidente, comprovei a vitalidade deste
continente que aqui reafirma sua diversidade ética e cultural", disse.
Para ele, a inclusão econômica de milhões
de africanos pode ser uma estratégia para superação mais rápida da
crise financeira internacional – assim como a expansão do mercado
interno brasileiro evitou a intensificação dos problemas no país.
Ao terminar sua fala, Lula afirmou que o
impasse em 2008 sobre as negociações comerciais de Doha, conduzidas
pela Organização Mundial do Comércio, não foi resolvido até hoje por
obra dos Estados Unidos, que se viam em eleições internas. Lula
defendeu o engajamento dos ativistas nesse processo de negociações,
bastante contestado por organizações que discutem o tema agrícola no
Fórum Social Mundial.