Após matéria veiculada pelo Correio sobre a “farra” das
diárias dos prefeitos paraibanos, novo levantamento realizado pelo Tribunal de
Contas do Estado (TCE) aponta que os vereadores também abusam do recebimento
desses recursos. Os dados revelam que 342 vereadores dos 223 municípios
paraibanos receberam quase meio milhão
(R$ 496.345,64) em diárias entre os meses de janeiro e outubro de 2011.
Com este dinheiro, seria possível pagar o salário de um
vereador de João Pessoa durante os quatro anos de mandato, tomando como base a
remuneração atual, que é de R$ 9,5 mil, a mais alta do Estado.
Com os mesmos recursos, seria possível pagar 310 salários
aos vereadores de Coxixola durante 3,5 anos. Lá, os vereadores recebem R$ 1,6
mil por mês.
Nos primeiros lugares do ranking dos “esbanjões” de diárias,
estão presidentes de Câmaras. O de Cajazeiras, Marcos Barros de Souza (PSDB),
lidera a lista. Ele recebeu R$ 12,9 mil de janeiro a outubro de 2011.
Em segundo lugar, está José Muniz de Lima (PSDC) do Conde,
que embolsou R$ 11,9 mil. Logo em seguida, aparece Domingos Sálvio Maximiano
Roberto, de Princesa Isabel que se beneficiou com R$ 11,1 mil.
O quarto lugar ficou com o presidente da Câmara de Cacimbas,
Cícero Bernardo Cezar (PR), que levou R$ 10,89 mil. No quinto lugar, figura
Marcos Eduardo Santos (PMDB) da cidade de Patos, que recebeu R$ 9,8 mil por
cinco diárias para local não informado ao Sagres do TCE.
O presidente do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba,
conselheiro Fernando Catão, disse que a concessão de diárias tem uma
normatização e uma legislação própria. “Isto, como se vê pelo levantamento
feito, não está sendo observado. Não se tem observado, nem seguido nenhuma
regra”, disse.
Ele reconheceu que há a necessidade dos políticos se
deslocarem de seus municípios para outros, devido à atuação administrativa.
“Isso é uma coisa normal, agora R$ 496 mil é um valor excessivo e só estudando
um padrão é que nós vamos verificar estes excessos”, afirmou Catão.
As justificativas dos vereadores parecem seguir a mesma
regra e são quase sempre iguais: valores foram usados para pagar despesas com a
hospedagem, alimentação e transporte durante viagens para João Pessoa, Campina
Grande e outras cidades do Estado e, também, para as cidades de Natal, Recife e
Brasília, com o objetivo de participar de congressos e cursos de qualificação.
Justificativa não convence
Embora tenha ocupado a quinta colocação no ranking dos
“esbanjões”, por ter “abocanhado” R$ 9,8 mil de uma só vez, a justificativa do
presidente da Câmara de Patos, Marcos Eduardo Santos, é a que mais chama a
atenção. Segundo consta no Sagres, o dinheiro recebido pelo parlamentar foi
referente a cinco diárias para local não informado. Neste caso, o valor de uma
diária saiu por quase R$ 2 mil.
Sobre o caso, Fernando Catão, disse que não pode afirmar
categoricamente o que está acontecendo, por não ter conhecimento, ainda, de
documentação que diga respeito ao assunto. Mas, adiantou que, a primeira vista,
“me parece um valor excessivo para cinco diárias para qualquer lugar do mundo”.
Com os R$ 9,8 mil recebidos por Marcos Eduardo Santos por
cinco diárias, seria possível passar 13 dias viajando por Madrid, Paris e
Londres, com direito a translado, visitas a museus, parques e passagem aérea.
Ainda sobrariam R$ 4,4 mil. Isto porque um pacote (promocional) de viagem para
três capitais da Europa custaria R$ 5,34 mil.
Com a sobra seria possível bancar nove noites em Orlando,
nos Estados Unidos, em apartamento duplo, com passagens aéreas inclusas, no
pacote que sairia por R$ 3.190,00. Com os R$ 1,27 mil restantes, daria para
passar três noites em uma pousada na ilha de Fernando de Noronha e, ainda,
sobrariam R$ 80,00 para fazer um almoço.
Marcos Eduardo prefere não falar
Procurado pela reportagem, Marcos Eduardo Santos atendeu ao
telefonema, e, após tomar conhecimento do assunto e de que se tratava de uma
entrevista, se passou por um assessor e disse: “O vereador está em João
Pessoa”. Perguntado se havia outro número de telefone que fosse possível falar
com o vereador, respondeu que não. Segundos depois, solicitou que fosse deixado
um contato para retorno. “Assim que ele (Marcos Eduardo) ligar eu passo o
recado para que ele entre em contato”, disse o vereador se passando por
assessor.
Minutos depois, quem atendeu ao telefone foi uma mulher que
se identificou com sendo a esposa de Marcos Eduardo Santos. Ela disse que
estava em João Pessoa com o vereador e que “ele deu uma saidinha e deixou o
telefone no carro, mas volta daqui a pouco”. Até o fechamento desta edição
muitas tentativas para falar com o vereador foram feitas, mas ele não mais
atendeu às ligações, nem retornou para os números que foram deixados.
Barros foi quem mais se beneficiou
O vereador que mais recebeu diárias em 2011, Marcos Barros
de Sousa, reconheceu como legítimos os R$ 12,9. “Eu tenho todos os comprovantes
destas despesas. Se eu gastar um real com estacionamento, eu pego o recibo,
pois todas as minhas despesas são comprovadas”, disse o vereador.
Ele garantiu que os valores foram utilizados para viagens a
João Pessoa com o objetivo de tratar de assuntos de interesses do município com
os deputados estaduais, com os secretários estaduais e para acompanhar a
análise das contas da Câmara junto ao TCE.
O levantamento do Tribunal de Contas confirmou que todas as
diárias recebidas pelo vereador de Cajazeiras foram utilizadas em viagens para
João Pessoa. Marcos Barros, porém, justificou o recebimento de R$ 3, 6 mil como
sendo para passar três dias em na Capital. Em outro momento, disse que recebeu
R$ 1,5 mil para cinco diárias e, mais adiante, R$ 600 para passar quatro dias
no mesmo lugar.
Apesar de admitir o recebimento dos R$ 12,9 mil em diárias,
negou que tenha embolsado R$ 3,6 mil por três diárias. “Eu não reconheço,
porque não existe. Este valor não existe, não tem diária de R$ 1.200,00. Eu vou
consultar minha assessoria para saber o que houve, mas acredito que aconteceu
algum erro”, reclamou o vereador.
O presidente da Câmara de Cajazeiras disse que reconhece
todas as diárias de R$ 300,00. “Eu reconheço as diárias de R$ 300,00, fora
isto, não”. Marcos Barros se defendeu dizendo que não tinha conhecimento do
valor elevado para três diárias. “Se isto existisse, eu estaria assinando minha
própria condenação”.
Já para os valores de R$ 600, ele disse que eram referentes
a quatro diárias de funcionários da Câmara Municipal, cada uma a R$ 150,00.
Embora o feito se repita por três e ele negue, a justificativa no Sagres é a
seguinte:
“Valor que se empenha corresponde a quatro diárias para
deslocar-se a cidade de João Pessoa, indo tratar de assuntos de interesse deste
poder legislativo”. Marcos alegou que a justificativa saiu no seu nome “porque
sou eu quem assino a liberação das diárias”.
Catão: disparidade é inadmissível
Para o presidente do TCE, esta disparidade de valores é
“inadmissível”. “Como é que três diárias têm o valor de R$ 3,6 mil e depois
quatro diárias tem o valor de R$ 600,00?”, indagou o presidente Fernando Catão.
Segundo ele, há algo de errado que precisa ser justificado. O conselheiro
informou que, sendo constatada a anomalia, será “dada à oportunidade a defesa
ao vereador, antes que o caso seja encaminhado ao Ministério Público para que o
órgão tome as devidas providências sobre o caso”.
Segundo Marcos Barros, a diária de um vereador em Cajazeiras
é de R$ 300,00 para viagens dentro do Estado e de R$ 400,00 para outros
Estados. Ele disse que três diárias são suficientes para resolver as questões
de interesse do município em João Pessoa.
“A gente coloca três diárias, porque, no máximo, passamos três dias em
João Pessoa para resolver os assuntos de nosso interesse”, contou o
vereador.
Marcos Barros disse também que viaja de ônibus, pelo menos,
três vezes ao mês para João Pessoa e que sempre se hospeda em “hotéis populares
como o Caiçara e em pousadas mais simples”. Com alimentação, o vereador afirmou
que gasta cerca de R$ 150,00 por dia.
Na contabilidade dele, três dias na Capital do Estado custam
em torno de R$ 920,00. “Eu gasto cerca de R$ 160,00 com as passagens de ônibus,
R$ 450,00 com a alimentação e R$ 360,00 de hotel”, garantiu Barros.
No Conde, José Muniz assume regalia
“Se tiver no Sagres que recebi R$ 11,9 mil com diárias, é
porque eu recebi, mas tudo comprovado”, afirmou o presidente da Câmara
Municipal de Conde, vereador José Muniz de Lima (PSDC). Ele disse que a diária
do presidente da Câmara é de R$ 500,00 para fora do Estado. Seguindo a risca o
valor estabelecido, a maioria de suas viagens foi para Recife (PE) e Natal (RN)
para participar de seminários e cursos destinados aos gestores públicos.
A maior diária recebida por José Muniz foi no valor de R$
2,5 mil para participar do 47º Seminário de Prefeitos, Vice-Prefeitos,
Vereadores, Secretários Municipais e Assessores no período de 27 de abril a 1º
maio de 2011, na cidade de Natal. A menor foi de R$ 100,00. “Importância referente a uma diária parcial
para participar do Encontro Legislativo -Interlegis no dia 12 de agosto de 2011
na cidade de João Pessoa-, conforme comprovante em anexo”, diz a justificativa
enviada ao Sagres.
No entanto, o vereador disse que quando vem a João Pessoa,
dispensa à diária. “Pela proximidade das duas cidades, não há necessidade de
solicitar o recurso”. Mas destacou: “Nós sempre encaminhamos os parlamentares
para os cursos e congressos de qualificação que acontecem fora do Estado, pois
acho muito importante e é por isto que sempre que posso, participo”.
Por outro lado, disse que o seu preparo como parlamentar vem
dos 20 anos de vida pública. “Ano passado, eu participei de quatro a cinco
eventos de qualificação, mas o que conta mesmo é o tempo de exercício de
mandato”, declarou o vereador.
Viagem a Natal
Muniz disse que quando viaja para Natal gasta de R$ 600,00 a
R$ 800,00 com hospedagem para cinco dias. Descontando o valor de R$ 800,00 dos
R$ 2 mil recebidos pelo vereador, restariam R$ 1,2 mil. Questionado se não
achava o valor alto para o período e pelo valor da hospedagem, José Muniz foi
enfático: “E eu não como, não? Porque o hotel só oferece o café da manhã”. E alegou que o saldo é utilizado em
alimentação e transporte.
R$ 200 em Cacimbas
O presidente da Câmara Municipal de Cacimbas, Cícero
Bernardo Cezar (PR), recebeu em dez meses R$ 10,89 mil em diárias. Do montante,
R$ 10,09 mil foram para viagens à cidade de Patos, que fica a 51,1 quilômetros
em um percurso que é feito em cerca de 40 minutos. O restante, R$ 800,00,
segundo informações prestadas ao Sagres, foi utilizado para uma viagem a João
Pessoa.
Cícero Bernardo informou que a diária de um vereador em
Cacimbas é de R$ 100,00 e a do presidente da Câmara R$ 200,00. Ele garantiu que
passa, no máximo, dois dias fora da cidade e que sempre viaja na companhia de
dois assessores, “devido ao perigo que estrada oferece, principalmente, à
noite”. O vereador afirmou que o valor de R$ 1 mil é suficiente para arcar com
as despesas de hospedagem, alimentação e transporte das três pessoas durante o
período que passa fora da cidade.
Sendo a diária do presidente da Câmara R$ 200,00, ele
deveria receber R$ 400,00 pelos dois dias, mas como afirmou que mais duas
pessoas o acompanham, o valor quase triplicou. Para não ter problemas com o
Tribunal de Contas do Estado, a justificativa é quase sempre a mesma e sem
especificar o número de diárias: “Importância que se empenha para o pagamento
de diárias ao vereador presidente durante viagens diversas à cidade de Patos
para tratar de assuntos de interesse da administração da Câmara Municipal”.
De uma só vez ele, embolsou R$ 1,7 para ir à cidade de
Patos. Nas informações prestadas ao Sagres, não constam para quantas diárias o
valor se refere. “Vou muito a Patos
encontrar com a deputada Francisca Mota que tem uma forte ligação com a região
e que sempre atende os nossos pleitos”, disse.
“Não é muito nem pouco”
Todos dos vereadores ouvidos pela reportagem não consideram
que os valores recebidos em diárias sejam elevados. Para eles, o montante é
justo para a responsabilidade que o cargo exige. “Não acho alto, porque é tudo
comprovado e como presidente da Câmara eu tenho que viajar”, argumentou Marcos
Barros, presidente da Câmara de Cajazeiras.
Para Cícero Bernardo Cezar, R$ 10,89 “não é muito, nem é
pouco”. “É o necessário”, reforçou, para fazer diversas viagens ao município de
Patos se reunir com a deputada Francisca Mota para tratar, segundo ele, de “reuniões
que resultam em benefícios para a cidade”.
Da mesma opinião, comunga o presidente da Câmara Municipal
do Conde, José Muniz de Lima que considerou pouco o número de diárias se
comparado ao dias do ano. “O ano tem 365 dias e eu tive 23 diárias durante do
ano inteiro. Eu não considero o valor alto e não vejo o valor, pois todos os
gastos foram comprovados com alimentação hospedagem e transporte”, disse o
vereador.
Correio da Paraíba
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