"Pretas do cabelo duro" e "Não gosto de
mulheres negras" foram expressões usadas pelo representante da Editora
Abril para impedir que as meninas participassem de promoção
Meninas vão à delegacia registrar queixa |
Alunos da Escola Estadual Guilherme Briggs, em Santa Rosa,
Zona Sul de Niterói, sentiram na pele, na tarde da última segunda-feira, a dor
do preconceito racial, que supostamente para muitos não ocorreria mais em nosso
país, muito menos nas dependências de uma feira literária, onde nossa cultura é
expressada das mais variadas formas, nas páginas publicadas por inúmeras
editoras. Preconceito e injúria racial são crimes passíveis de prisão, no
artigo 9º da Lei 7716/89.
De acordo com a diretora da escola, Alcinéia de Souza, o
fato entristeceu e chocou os alunos da unidade, uma das mais conhecidas do
município, foi registrado ontem da Delegacia Legal de Icaraí (77ª DP), e
formalmente encaminhado à Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos
Humanos.
De acordo com a diretora do estabelecimento de ensino, na
tarde de segunda-feira ela levou um grupo de 45 alunos que cursam o Ensino
Médio da escola até a Bienal do Livro 2011, que se realiza no pavilhão do
Riocentro, na Zona Oeste do Rio. No local, entusiasmados os alunos, com idades
entre 15 e 17 anos, se espalharam para apreciar os vários estandes. Segundo os
alunos e a diretora, num deles da Editora Abril ocorria uma promoção, onde eram
distribuídos uma espécie de senha para que os jovens prestigiassem a tarde de
autógrafos do ator e apresentador Rodrigo Faro.
Entusiasmadas, duas alunas do colégio, de 16 e 17 anos, se
dirigiram até um dos promotores, inicialmente identificado apenas como
"Pedro" ou "Roger" - no intuito de conseguir uma das
senhas. Do promotor as alunas ouviram (incrédulas) insultos do tipo: "Não
vamos dar a senha porque vocês são pretas do cabelo duro", e também
"não gosto de mulheres negras, por isso não darei senhas para vocês".
Segundo uma das alunas, indignada com a ofensa ainda tentou argumentar com o
promotor - "isso é um tipo de bullying, e pode te trazer problemas".
Com resposta o promotor rebateu, afirmando que isso não daria problema nenhum
para ele".
Como o grupo estava espalhado pelo pavilhão de exposições, a
diretora da escola afirmou que só tomou conhecimento do fato quando os alunos
já estavam deixando o evento. Revoltada, Alcinéia retornou ao estende da
Editora Abril, à procura do responsável pela representação da empresa, que de
acordo com ela pediu-lhe desculpas (omitindo a identificação do promotor) e
alegando que tomaria providências. "Sentindo-se humilhada, uma das alunas
disse que sequer conseguiu dormir de segunda para terça-feira", explicou
Alcinéia, que no início da tarde de ontem, acompanhada dos alunos, pais, e de
um advogado (que também é professor da unidade), José Carlos de Araújo,
registrou queixa de crime de Injúria e Preconceito Racial na 77ª DP. A
distrital encaminhou o procedimento para a Delegacia Legal do Recreio dos
Bandeirantes (42ª DP).
"Ensinamos os princípios da cidadania para os alunos,
explicando inclusive que independe de quem sejam, e agora eles passam por uma
experiência terrível dessas ? Os alunos da escola estão chocados com o que
aconteceu. Fiz questão de comparecer junto com os pais desses estudantes na DP
para relatar esse triste fato. Esses estudantes são como filhos pra mim",
disse Alcinéia. "Em pleno século XXI isso ainda acontece em nosso país.
Esse fato não se esgota na esfera criminal. Não desejamos isso para nosso
país", disse José Carlos de Araujo, que junto com a diretora, os alunos, e
com a cópia do registro levou também ontem o fato ao conhecimento da Secretaria
Estadual de Assistência Social de Direitos Humanos para que providências sejam
tomadas.
Representantes da Editora Abril não quiseram se pronunciar.
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