A eleição de Dilma Rousseff trouxe à tona, entre muitas
outras coisas, o que há de pior no Brasil em relação aos preconceitos. Sejam
eles religiosos, partidários, regionais, foram lançados à luz de maneira
violenta, sádica e contraditória.
Já escrevi sobre os preconceitos religiosos em outros textos
e a cada dia me envergonho mais do povo que se diz evangélico (do qual faço
parte) e dos pilantras profissionais de púlpito, como Silas Malafaia, Renê
Terra Nova e outros, que se venderam de forma absurda aos seus candidatos. E
que fique bem claro: não os cito por terem apoiado o Serra... outros pastores
se venderam vergonhosamente para apoiarem a candidata petista. A luta pelo
poder ainda é a maior no meio do baixo-evangelicismo brasileiro.
Mas o que me motivou a escrever este texto foi a celeuma
causada na internet, que extrapolou a rede mundial de computadores, pelas
declarações da paulista, estudante de Direito, Mayara Petruso, alavancada por
uma declaração no twitter: "Nordestino não é gente. Faça um favor a SP,
mate um nordestino afogado!".
Infelizmente, Mayara não foi a única. Vários outros
“brasileiros” também passaram a agredir os nordestinos, revoltados com o
resultado final das eleições, que elegeu a primeira mulher presidentE ou presidentA
(sim, fui corrigido por muitos e convencido pelos "amigos" Houaiss e
Aurélio) do nosso país.
E fiquei a pensar nas verdades ditas por estes jovens, tão
emocionados em suas declarações contra os nordestinos. Eles têm razão!
Os nordestinos devem ficar quietos! Cale a boca, povo do
Nordeste!
Que coisas boas vocês têm pra oferecer ao resto do país?
Ou vocês pensam que são os bons só porque deram à literatura
brasileira nomes como o do alagoano Graciliano Ramos, dos paraibanos José Lins
do Rego e Ariano Suassuna, dos pernambucanos João Cabral de Melo Neto e Manuel
Bandeira, ou então dos cearenses José de Alencar e a maravilhosa Rachel de
Queiroz?
Só porque o Maranhão nos deu Gonçalves Dias, Aluisio
Azevedo, Arthur Azevedo, Ferreira Gullar, José Louzeiro e Josué Montello, e o
Ceará nos presenteou com José de Alencar e Patativa do Assaré e a Bahia em seus
encantos nos deu como herança Jorge Amado, vocês pensam que podem tudo?
Isso sem falar no humor brasileiro, de quem sugamos de vocês
os talentos do genial Chico Anysio, do
eterno trapalhão Renato Aragão, de Tom Cavalcante e até mesmo do palhaço
Tiririca, que foi eleito o deputado federal mais votado pelos... pasmem...
PAULISTAS!!!
E já que está na moda o cinema brasileiro, ainda poderia
falar de atores como os cearenses José Wilker, Luiza Tomé, Milton Moraes e
Emiliano Queiróz, o inesquecível Dirceu Borboleta, ou ainda do paraibano José
Dumont ou de Marco Nanini, pernambucano.
Ah! E ainda os baianos Lázaro Ramos e Wagner Moura, que será
eternizado pelo “carioca” Capitão Nascimento, de Tropa de Elite, 1 e 2.
Música? Não, vocês nordestinos não poderiam ter coisa boa a
nos oferecer, povo analfabeto e sem cultura...
Ou pensam que teremos que aceitar vocês por causa da
aterradora simplicidade e majestade de Luiz Gonzaga, o rei do baião? Ou das
lindas canções de Nando Cordel e dos seus conterrâneos pernambucanos Alceu
Valença, Dominguinhos, Geraldo Azevedo e Lenine? Isso sem falar nos paraibanos
Zé e Elba Ramalho e do cearense Fagner...
E Não poderia deixar de lembrar também da genial família
Caymmi e suas melofias doces e baianas a embalar dias e noites repletas de
poesia...
Ah! Nordestinos...
Além de tudo isso, vocês ainda resistiram à escravatura? E
foi daí que nasceu o mais famoso quilombo, símbolo da resistência dos negros á
força opressora do branco que sabe o que é melhor para o nosso país? Por que
vocês foram nos dar Zumbi dos Palmares? Só para marcar mais um ponto na sofrida
e linda história do seu povo?
Um conselho, pobres nordestinos. Vocês deveriam aprender
conosco, povo civilizado do sul e sudeste do Brasil. Nós, sim, temos coisas
boas a lhes ensinar.
Por que não aprendem conosco os batidões do funk carioca?
Deveriam aprender e ver as suas meninas dançarem até o chão, sendo
carinhosamente chamadas de “cachorras”. Além disso, deveriam aprender também
muito da poesia estética e musical de Tati Quebra-Barraco, Latino e Kelly Key.
Sim, porque melhor que a asa branca bater asas e voar, é ter festa no apê e
rolar bundalelê!
Por que não aprendem do pagode gostoso de Netinho de Paula?
E ainda poderiam levar suas meninas para “um dia de princesa” (se não apanharem
no caminho)! Ou então o rock melódico e poético de Supla! Vocês adorariam!!!
Mas se não quiserem, podemos pedir ao pessoal aqui do lado,
do Mato Grosso do Sul, que lhes exporte o sertanejo universitário... coisa da
melhor qualidade!
Ah! E sem falar numa coisa que vocês tem que aprender
conosco, povo civilizado, branco e intelectualizado: explorar bem o trabalho
infantil! Vocês não sabem, mas na verdade não está em jogo se é ou não trabalho
infantil (isso pouco vale pra justiça), o que importa mesmo é o QUANTO esse
trabalho infantil vai render. Ou vocês não perceberam ainda que suas crianças
não podem trabalhar nas plantações, nas roças, etc. porque isso as afasta da
escola e é um trabalho horroroso e sujo, mas na verdade, é porque ganha pouco.
Bom mesmo é a menina deixar de estudar pra ser modelo e sustentar os pais, ou
ser atriz mirim ou cantora e ter a sua vida totalmente modificada, mesmo que
não tenha estrutura psicológica pra isso... mas o que importa mesmo é que vão
encher o bolso e nunca precisarão de Bolsa-família, daí, é fácil criticar quem
precisa!
Minha mensagem então é essa: - Calem a boca, nordestinos!
Calem a boca, porque vocês não precisam se rebaixar e tentar
responder a tantos absurdos de gente que não entende o que é, mesmo sendo
abandonado por tantos anos pelo próprio país, vocês tirarem tanta beleza e
poesia das mãos calejadas e das peles ressecadas de sol a sol.
Calem a boca, e deixem quem não tem nada pra dizer jogar
suas palavras ao vento. Não deixem que isso os tire de sua posição majestosa na
construção desse povo maravilhoso, de tantas cores, sotaques, religiões e
gentes.
Calem a boca, porque a história desse país responderá por si
mesma a importância e a contribuição que vocês nos legaram, seja na literatura,
na música, nas artes cênicas ou em quaisquer situações em que a força do seu
povo falou mais alto e fez valer a máxima do escritor: “O sertanejo é, antes de
tudo, um forte!”
Que o Deus de todos os povos, raças, tribos e nações, os
abençoe, queridos irmãos nordestinos!
Extraido do Blog Robson Medeiros
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