Governo contrata e, em troca, detentos ganham salário e
redução da pena
Presos passam a roupa que confeccionam no
presídio de Tremembé, interior de São Paulo
F.L.A acorda cedo, veste seu uniforme, bebe rápido o café e
corre para o centro de Brasília, onde cuida da manutenção do canteiro de obras
do Estádio Nacional de Brasília, uma das sedes da Copa do Mundo de 2014. Essa
história não teria nada demais se F.L.A – hoje com 23 anos – não estivesse
preso e tirasse do estádio parte do sustento da mulher e dos dois filhos.
Presos reduzem condenação trabalhando na cadeia. Veja fotos
- É uma realidade bastante diferente. Agora eu estou
ganhando dinheiro suado, não é mais o dinheiro fácil de antes.
Esse é só um exemplo dentre outros parecidos: detentos que
estão construindo estádios da Copa do Mundo para reconstruir a vida aprendendo
uma profissão, ganhando dinheiro e, de quebra, abatendo a pena. Para cada três
dias trabalhados, um dia a menos na prisão.
Ao todo, 76 presos estão ajudando a construir algumas arenas
que vão servir de palco para a Copa no Brasil. Em Belo Horizonte, 28 trabalham
nos canteiros de obra do Mineirão. Em Salvador, 30 presos constroem a Arena Fonte
Nova, enquanto em Brasília há dez presos e na Arena Pantanal, em Cuiabá, há
oito condenados.
Enquanto estiver ajudando a levantar o Estádio Nacional de
Brasília, F.L.A vai receber todo mês R$ 554 como Bolsa Ressocialização mais R$
220 de auxílio-transporte. O acordo firmado entre o governo federal, a Funap
(Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso) e o CNJ (Conselho Nacional de
Justiça) remunera ainda mais do que fixou a LEP (Lei de Execuções Penais), que
obriga o pagamento de 75% do salário mínimo, hoje em R$ 545. Esse dinheiro vai
direto para uma conta judicial, e só pode ser sacado depois que o detento
cumpre a pena ou quando a família ganha na Justiça o direito de resgatá-lo.
É sob esse sistema que o Ministério dos Esportes dá emprego
para detentos que produzem material esportivo para programas sociais em 103
fábricas pelo país. Entre 2003 e 2010, 2,9 milhões de bolas, redes e bolsas
esportivas foram produzidos, reinserindo 13 mil presos, segundo dados do
ministério.
Mas uma das maiores contratações de presos em um único
programa do governo federal acontece no Maranhão, onde 300 detentos foram
incumbidos de levantar as paredes de uma das principais vitrines do governo
federal, o Minha Casa, Minha Vida, de casas populares.
O presidente do Sinduscon (Sindicato das Indústrias da
Construção Civil) no Estado, João Alberto Teixeira Mota Filho, admite que as
seis empreiteiras que contrataram a mão de obra prisional estavam de olho mesmo
é na isenção de encargos trabalhistas.
- Porém, tão ou mais importante do que isso é a oportunidade
que vamos dar para essas pessoas recomeçarem a vida.
A diretora-executiva da Funap de São Paulo, Lúcia Casali
(responsável pelos cursos e vagas de emprego aos presos do Estado), confirma a
existência de "muito empresário que procura a gente porque pensa na mão de
obra barata”.
- Desde 2006, eu rescindi mais de 2.000 contratos com esse
perfil.
Na ausência de empresas, o próprio governo contrata. É o
caso dos dez presos que produzem tijolos ecológicos para o PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento) no Complexo Penitenciário de Gericinó, zona Oeste do
Rio de Janeiro.
Lá, eles produzem 50 mil blocos por mês que dispensam
cimento na construção. Constituído de solo natural e sem necessidade de levar
ao forno, o tijolo não consome energia.
É também no Rio que a ONG Tem Quem Queira dá emprego a 20
homens e mulheres condenados. Criada pelos donos da agência de eventos LG
Ventura, Adriana Gryner e Marco Luna, ela usa restos de banner para fazer
estojos, tapetes, carteiras, sacolas e bolsas. Ao R7, Adriana conta que as
confecções já produzem todo mês 4.000 peças assinadas por estilistas como
Isabela Capeto, Renata Abranches e Ronaldo Fraga.
- Pra mim, esse sucesso foi uma surpresa.
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