Luis Nassif rebate ofensiva de Merval Pereira contra livro
'A Privataria Tucana'
Reproduzimos, abaixo, a íntegra do texto de Merval Pereira.
O jornalista das organizações Globo se esforça para desconstruir o livro de
Amaury Ribeiro Jr., mas o insucesso de sua empreitada é evidenciado pelo também
jornalista Luis Nassif (em itálico sublinhado).
O "imortal" Merval Pereira
O livro “Privataria tucana”, da Geração Editorial, de
autoria de Amaury Ribeiro Jr, é um sucesso de propaganda política do chamado
marketing viral, utilizando-se dos novos meios de comunicação e dos blogueiros
chapa-branca para criar um clima de mistério em torno de suas denúncias supostamente
bombásticas, baseadas em “documentos, muitos documentos”, como definiu um
desses blogueiros em uma entrevista com o autor do livro.
Disseminou-se a idéia de que a chamada “imprensa
tradicional” não deu destaque ao livro, ao contrário do mundo da internet, para
proteger o ex-candidato tucano à presidência José Serra, que é o centro das
denúncias.
Estariam os “jornalões” usando dois pesos e duas medidas em
relação a Amaury Jr, pois enquanto acatam denúncias de bandidos contra o
governo petista, alegam que ele está sendo processado e, portanto, não teria
credibilidade?
É justamente o contrário. A chamada “grande imprensa”, por
ter mais responsabilidade que os blogueiros ditos independentes, mas que, na
maioria, são sustentados pela verba oficial e fazem propaganda política,
demorou mais a entrar no assunto, ou simplesmente não entrará, por que precisava
analisar com tranqüilidade o livro para verificar se ele realmente acrescenta
dados novos às denúncias sobre as privatizações, e se tem provas.
Como assim? Qual a responsabilidade na denúncia de que foram
entregues centenas de milhares de dólares em um envelope no Palácio do
Planalto? E a do "consultor" Ruben Quícoli, que dizia que com propina
seria possível levantar R$ 10 bi no BNDES para uma fabriqueta? E a denúncia de
que Dilma encomendaria dossiês para o Ministério da Justiça, ou a ficha falsa
de Dilma? Merval deveria ter mais responsabilidade ao escrever, ainda mais
criando para si esse papel de jornalista sério em veículo sério. Não é do
estilo do Merval essas manifestações de indignação. Corto um dedo se o ghost
writer dessa tertúlia não é o próprio Serra.
Outros livros, como "O Chefe", de Ivo Patarra, com
acusações gravíssimas contra o governo de Lula, também não tiveram repercussão
na "grande imprensa" e, por motivos óbvios, foram ignorados pela
blogosfera chapa-branca.
Desde que Pedro Collor denunciou as falcatruas de seu irmão
presidente, há um padrão no comportamento da “grande imprensa”: as denúncias
dos que participaram das falcatruas, sejam elas quais forem, têm a
credibilidade do relato por dentro do crime.
Quem disse que Pedro Collor participou de alguma coisa no
governo do seu irmão? Sua bronca maior era de não estar dentro.
Deputado cassado e presidente nacional do PTB, Roberto
Jefferson desencadeou o escândalo do mensalão com o testemunho pessoal de quem
esteve no centro das negociações, e transformou-se em um dos 38 réus do
processo.
O ex-secretário de governo Durval Barbosa detonou a maior
crise política da história de Brasília, com denúncias e gravações que
culminaram com a prisão do então governador José Roberto Arruda e vários políticos.
Fantástico Merval! Seu brilhantismo consagrou uma nova
máxima jurídica: criminoso tem credibilidade porque participou do crime; não
criminoso não tem porque, por não ser criminoso, não conhece os escaninhos do
crime.
E por aí vai. Já Amaury Ribeiro Jr. foi indiciado pela
Polícia Federal por quatro crimes: violação de sigilo fiscal, corrupção ativa,
uso de documentos falsos e oferta de vantagem a testemunha, tendo participado,
como membro da equipe de campanha da candidata do PT, de atos contra o adversário
tucano.
O livro, portanto, continua sendo parte da sua atividade
como propagandista da campanha petista e, evidentemente, tem pouca
credibilidade na origem.
Na sua versão no livro, Amaury jura que não havia intenção
de fazer dossiês contra Serra, que foi contratado “apenas” para descobrir
vazamentos internos e usou seus contatos policiais para a tarefa que,
convenhamos, conforme descrita pelo próprio, não tem nada de jornalística.
Ele alega que a turma paulista de Rui Falcão (presidente do
PT) e Palocci queria tirar os mineiros ligados a Fernando Pimentel da campanha,
e acabou criando uma versão distorcida dos fatos.
No caso da quebra de sigilo de tucanos, na Receita de Mauá,
Amaury diz que o despachante que o acusou de ter encomendado o serviço mentiu
por pressão de policiais federais amigos de José Serra.
Enfim, Amaury Ribeiro Jr, tem que se explicar antes de
denunciar outros, o que também enfraquece sua posição.
O criminoso não precisa explicar suas intenções: basta ter
participado dos crimes. O Amaury tem que explicar. Merval ambiciona a
imortalidade tornando-se membro da ABL. Jornalistas ambicionam a imortalidade
escrevendo reportagens definitivas. Acho que Merval se esqueceu definitivamente
do que é a emoção de construir uma grande reportagem.
Ele e seus apoiadores ressaltam sempre que 1/3 do livro é
composto de documentos, para dar apoio às denúncias.
Mas se os documentos, como dizem, são todos oficiais e estão
nos cartórios e juntas comerciais, imaginar que revelem crimes contra o
patrimônio público é ingenuidade ou má-fé.
Documentos oficiais obtidos nas ilhas Virgens. Se eram tão
inocentes assim, qual a razão de terem sido abafados na CPI do Banestado?
Que trapaceiro registra seus trambiques em cartórios?
Entre outros, quem pretende legalizar dinheiro sujo e também
aquele que tem medo de ser enganado por testas de ferro e só confia na própria
família. Aliás, outro fato que poderia ter sido explicado é a razão do casal Verônica
Serra ter mudado o regime de bens do casamento pouco antes de começarem as
transferências de recursos.
Há, a começar pela escolha do título – Privataria Tucana –
uma tomada de posição política do autor contra as privatizações.
E a maneira como descreve as transações financeiras mostra
que Amaury Ribeiro Jr. se alinha aos que consideram que ter uma conta em
paraíso fiscal é crime, especialmente se for no Caribe, e que a legislação de
remessa de dinheiro para o exterior feita pelo Banco Central à época do governo
Fernando Henrique favorece a lavagem de dinheiro e a evasão de divisas.
Utilizam contas em paraísos fiscais empresas para
planejamento tributário (como se financiar em leasing). Se quiser uma defesa
eficiente, basta Serra/Merval explicar a razão de Verônica Serra precisar de
conta em paraíso fiscal. Mais que isso: mostrar a origem dos recursos que
enviou para o Brasil e que permitiram ao pai esquentar a casa em que morava
desde fins dos anos 80. Se não foi propina, foram resultados de empresas no
exterior. Que empresas foram essas, quais os resultados apresentados? Simples
assim.
É um ponto de vista como outro qualquer e ele tenta por
todas as maneiras mostrar isso, sem, no entanto, conseguir montar um quadro
factual que comprove suas certezas.
Vários personagens, a maioria ligada a Serra, abrem e fecham
empresas em paraísos fiscais, com o objetivo, segundo ilações do autor, de
lavar dinheiro proveniente das privatizações e internalizá-lo legalmente no
País.
Para quê é, então?
Acontece que passados 17 anos do primeiro governo de
Fernando Henrique Cardoso, e estando o PT no poder há 9 anos, não houve um
movimento para rever as privatizações.
O que isso tem a ver com suspeitas de pagamento de propina?
É malandragem argumentativa primária, como se o simples fato de ter-se
constatado a propina obrigasse à reversão da privatização.
E os julgamentos de processos contra os dirigentes da época
das privatizações não dão sustentação às críticas e às acusações de
“improbidade administrativa” na privatização da Telebrás.
A decisão nº 765/99 do Plenário do Tribunal de Contas da
União concluiu que, além de não haver qualquer irregularidade no processo, os
responsáveis “não visavam favorecer em particular o consórcio composto pelo
Banco Opportunity e pela Itália Telecom, mas favorecer a competitividade do
leilão da Tele Norte Leste S/A, objetivando um melhor resultado para o erário
na desestatização dessa empresa”.
A escolha do Opportunity, por si, caracteriza um benefício.
Na sequência, o Opportunity deposita US$ 5 milhões na conta da Verônica.
Verônica transfere para o Brasil e "compra" a casa em que o pai mora.
Por acaso o TCU analisou essa sequência de episódios? Claro que não: apenas a
montagem do consórcio em si.
Também o Ministério Público de Brasília foi derrotado e, no
recurso, o Tribunal Regional Federal do Distrito Federal decidiu, através do
juiz Tourinho Neto, não apenas acatar a decisão do TCU mas afirmar que “não
restaram provadas as nulidades levantadas no processo licitatório de
privatização do Sistema Telebrás. Da mesma forma, não está demonstrada a má-fé,
premissa do ato ilegal e ímprobo, para impor-se uma condenação aos réus.
Claro que não restaram. Na época não havia documentos, nem
evidências de pagamento de propina. Agora, há.
Também não se vislumbrou ofensa aos princípios
constitucionais da Administração Pública para configurar a improbidade
administrativa.”.
O livro de Amaury Ribeiro Jr. está em sexto lugar na lista
dos mais vendidos de “não-ficção”. Talvez tivesse mais sucesso ainda se
estivesse na lista de “ficção”.
Merval está na Academia Brasileira de Letras por apenas um
livro que é coletânea de artigos. Merval até hoje se vangloria - e está em seu
discurso de posse na ABL - por ter participado de uma grande reportagem que
tinha Amaury como autor (ao lado de Ascânio e outros) e Merval apenas na
condição de diretor da sucursal.
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