Brasil tem 16 milhões de pessoas vivendo na pobreza extrema,
e 70% são negros
Criar estratégias para localizar e inscrever a população
negra em programas de distribuição de renda como o Bolsa Família contribuirá
para a diminuição do número dos miseráveis no país. A avaliação é do economista
Marcelo Paixão, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
- É necessário perseguir expressamente um recorte racial. É
preciso prestar atenção para ver se a população negra está sendo efetivamente
atendida pelo programa porque, muitas vezes, a baixa autoestima faz com que [os
negros] não se sintam merecedores.
Vivendo com renda igual ou menor a R$ 70, os indigentes
brasileiros somam 16,2 milhões de indivíduos - cerca de 8,5% da população -,
dos quais 70,8% são negros, de acordo com o Censo 2010, elaborado pelo IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Paixão aponta a ausência de estratégias específicas para
incluir a população negra programas de transferência de renda.
O economista defende a importância do Bolsa Família no
combate à pobreza. O especialista avalia que, somado ao crescimento econômico e
à geração de emprego, o programa ajudou a reduzir diferenças sociais.
O professor destaca o acesso a uma alimentação mais saudável
pela famílias de negros, como atesta o Relatório Anual das Desigualdade Raciais
no Brasil 2009-2010. Publicado pelo Instituto de Economia da UFRJ, o documento
tem o professor como um de seus principais autores.
O relatório mostra que entre os beneficiários do Bolsa
Família, os negros são maioria entre as famílias que passaram a ter mais
alimentos (75,7%) e entre os que ampliaram a compra de gêneros infantis
(64,2%). Os percentuais de famílias brancas são de 70,1% e de 60,9%,
respectivamente.
É o caso da diarista Ana Lúcia Melchiades, de 41 anos de
idade, autodeclarada parda. Moradora de Caxambi, zona norte do Rio, é separada
e vive em uma casa de um cômodo (que divide entre quarto, cozinha e banheiro)
com os sete filhos, entre 6 anos e 23 anos de idade.
Beneficiária do Bolsa Família há quase oito anos, ela diz
que o dinheiro extra ajuda na compra de frutas e legumes.
- A gente tem que comprar um monte de coisas, roupas,
sapatos e, às vezes, não dá para ter tudo.
Segundo Marcelo Paixão, embora seja mais fácil encontrar pessoas
como Ana Lúcia em áreas urbanas, onde estão 53,3% dos miseráveis do país, é
preciso avançar na identificação dos miseráveis negros no campo.
- Eles podem estar concentrados em comunidades de
remanescentes de escravos, ou não. Tem que ir lá.
Segundo estimativa do IBGE, a área rural concentra 15,6% da
população brasileira e 46,7% dos indigentes - ou seja, um em cada quatro
moradores.
Elaborado com base em dados estatísticos do governo e de
institutos de pesquisa, o relatório também traçou um perfil dos beneficiários
do Bolsa Família.
O estudo revela que, no programa, os negros estão em maior
número entre as famílias com mais de cinco pessoas (48,7% ante 41,2% de
brancos); morando em um cômodo ou barraco (2,4% ante 1,5%) e com iluminação
proveniente de "outras fontes" sem ser a elétrica ou de gerador (3,4%
ante 2%).
Para Paixão, "a população negra herda um background
pior do que as famílias brancas e têm mais dificuldade de sair da
pobreza".
- A questão é: em uma vida herdando uma situação de miséria,
qual a capacidade que esse grupo tem de sair dessa situação de privação?
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